setembro 06, 2011

ANTHONY SHAFFER

EX-ESPIÃO AMERICANO REVELA QUAL A PALAVRA QUE USAVA ASSUSTAR SUSPEITOS DURANTE INTERROGATÓRIOS NO AFEGANISTÃO: “GUANTÁNAMO”

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Anthony Shaffer, em entrevista à Globonews : livro destruído pelo Pentágono ( Foto: Eduardo Torres )

A Globonews leva ao ar nesta terça-feira, às 20:05, na série DOSSIÊ GLOBONEWS: SEGREDOS DE ESTADO, uma entrevista com Anthony Shaffer, o espião americano que, depois dos atentatos do 11 de Setembro, cumpriu duas missões no Afeganistão, na chamada “Guerra ao Terror”.

O coronel Anthony Shaffer se envolveu numa polêmica inesperada: quando voltou do Afeganistão, depois de participar de operações secretas contra a organização terrorista Al-Qaeda, resolveu publicar um livro. Como sempre acontece, o texto foi submetido previamente à aprovação do comando militar americano.

Título: “Operation Dark Heart” ( o título é uma citação indireta ao filme Apocalipse Now, a obra-prima de Francis Ford Coppola inspirada em “Heart of Darkness”/”O Coração das Trevas”, o livro de Joseph Conrad. A citação não foi gratuita : quando se embrenhou numa área remota do Afeganistão, no encalço de militantes da Al-Qaeda, Shaffer diz que se lembrou do filme de Coppola ).

Assim que o livro saiu, Shaffer teve uma péssima surpresa: o Pentágono comprou – e destruiu- todos os exemplares da primeira edição. Um porta-voz se limitou a dizer que o texto trazia informações que poderiam comprometer a segurança nacional. Resultado: os poucos exemplares que escaparam da destruição terminaram leiloados na Internet por preços que chegaram a dois mil exemplares. Viraram “relíquia”. Uma nova edição, cheia de tarjas pretas, foi lançada.

O livro descreve uma operação que, na avaliação de Shaffer, deveria ter sido realizada, em território paquistanês, contra uma base da Al-Qaeda. Estava tudo pronto para que um ponto de reunião de líderes da Al-Qaeda fosse bombardeado. Mas o comando militar americano não autorizou a incursão. Tempos depois, Bin Laden seria capturado em circunstâncias parecidas : numa incursão clandestina realizada em território do Paquistão.

O New York Times deu destaque à proibição do livro do espião. Disse que a “tática do Pentágono” era “destruir livros para guardar segredos”.

Shaffer já tinha virado notícia ao fazer uma declaração que causara alvoroço: disse que, um ano antes dos ataques do 11 de Setembro, encontrara, durante uma investigação feita nos EUA, uma foto de Mohammed Atta, o estudante egípcio que viria a liderar o grupo de terroristas que lançaram aviões contra o Word Trade Center e o Pentágono. A investigação sobre Atta, no entanto, não teria sido levada adiante - o que configuraria um grave erro de avialiação dos órgãos de segurança interna dos EUA.

Convocado a depor no Congresso americano, diante da Comissão que investigava o 11 de Setembro, Shaffer manteve o que disse: o homem que ele vira numa foto um ano antes dos ataques era Atta, sim. Mas a Comissão não conseguiu uma prova definitiva de que o homem que viria a chefiar o bando de terroristas tinha sido identificado com tanta antecedência. Ficou, no ar, a polêmica.

Shaffer gravou a entrevista para a Globonews num domingo, em casa, nos arredores de Washington. Revelou qual a palavra que usava para assustar prisioneiros durante interrogatórios: Guantánamo, a prisão que os EUA abriram numa base militar para abrigar suspeitos de terrorismo. A base, como se sabe, fica em território cubano, numa área arrendada desde o início do Século XX pelo governo americano. O próprio Shaffer reconhece, na entrevista, que a reputação de Guantánamo é “péssima”. Assim, bastaria citar o nome da prisão para despertar medo nos interrogados.

Shaffer não se recusa a tocar num ponto delicado: o tratamento dado a prisioneiros. Em resumo, o ex-espião se declara contra o uso de métodos violentos, mas diz que, numa situação extrema, para evitar um atentado devastador, ele recorreria à tortura para arrancar informações de um suspeito que soubesse o que iria acontecer.

Um trecho da entrevista:

“Uma das melhores abordagens em qualquer interrogatório é usar o medo. E não técnicas violentas. Não sou a favor de interrogatórios violentos. Não apoio a tortura. Mas, se você identifica o medo de alguém, pode usar o medo como ferramenta. Usei, muitas vezes, a ideia de Guantánamo, uma prisão lendária e com péssima reputação na cabeça de qualquer um. A maioria não quer ir para lá. Durante os interrogatórios, em especial de indivíduos suscetíveis, que não queriam ir para Guantánamo, citar a prisão com certeza é uma boa ferramenta. É como dizer: “Se você não cooperar, se não sentirmos que você vai falar toda a verdade, vamos mandar você para Guantánamo!”. A ameaça é, claramente, bem mais eficaz do que o ato em si. Era o que usávamos. Interrogamos um cidadão americano que, obviamente, temia ir para Guantánamo. Usamos o medo em nosso favor. E ele acabou cedendo, porque teve medo. Isso é o que deve ser feito nos bons interrogatórios”.

O senhor torturaria alguém ?

“Se houvesse um perigo claro e iminente, ou se eu acreditasse que aquele indivíduo tivesse informações sobre atos que poderiam resultar na morte de dezenas de milhares ou milhões de pessoas, como um ataque nuclear, por exemplo, acho que sim. Se eu estivesse convicto de alguém tinha a informação, eu torturaria. Isso é muito simples. Em interrogatórios com tortura, as pessoas falam o que você quer ouvir, para fazerem com que você vá embora. Isso, no entanto, não quer dizer que elas saibam o que você quer saber! Só há uma possibilidade: só um ataque nuclear ou outro ataque potencialmente catastrófico justificaria o uso de tortura. Nunca vi algo assim em todos esses anos. Ouvi amigos e parceiros comentarem a respeito. É um cenário altamente improvável, mas é o único que, para mim, justificaria a tortura. Quero deixar claro que não somos treinados para torturar”.

“Com base em experiência própria, eu, francamente, nunca acreditei na necessidade de interrogatórios violentos quando você entende como é o sujeito que você interroga. Hoje, esse debate ainda continua. Não estou dizendo – quero que fique bem claro ! – que eu nunca torturaria alguém.. Mas não acredito que seja o caminho correto. Talvez por um momento, como Jack Bauer ? Não creio. Quero deixar claro, novamente, que não acho má ideia obrigar alguém a ficar acordado ouvindo músicas de Perry Como… Há coisas que incomodam muito o prisioneiro. Como incentivo para que ele fale, podemos usar melhoria das condições do cárcere, assim como os seus próprios medos. É só mantê-lo acordado, não deixar que as coisas fiquem agradáveis e ir devolvendo os privilégios conforme ele for cooperando. Nada além. Isso não é tortura. É criar incômodos até o sujeito começar a cooperar”.

Posted by geneton at setembro 6, 2011 01:46 PM
   
   
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