junho 28, 2014

TEORIA GERAL DO CHORORÔ BRASILEIRO

Atenção, sociólogos, antropólogos e psicólogos de plantão: que tal alguém produzir uma Teoria Geral do Chororô Brasileiro? Já é hora.
O capitão da seleção brasileira de setenta, Carlos Alberto Torres, fez um comentário interessante no programa "É Campeão" - que estreou esta noite, no Sportv. Disse que jamais tinha visto tantos jogadores chorarem antes e, até, durante os jogos - como acontece com os brasileiros. "É uma coisa inédita". O programa - bela ideia - reúne quatro capitães de seleções campeãs do mundo: além de Carlos Alberto,o argentino Daniel Passarella, o alemão Lothas Mattaus e o italiano Fabio Cannavaro, sob o comando de André Rizek. A pergunta foi feita aos três estrangeiros: alguém já tinha visto algo assim? Resposta unânime: não.

O transbordamento de lágrimas em momentos improváveis - pelo visto - parece ser um traço brasileiro.
Júlio César, o herói da vitória sobre o Chile, chorou antes da cobrança dos pênaltis - algo jamais visto. Em outros momentos, as câmeras mostraram Tiago Silva chorando. Neymar literalmente desabou, aos prantos, com o rosto colado na grama. David Luís também derramou lágrimas "aos borbotões", como diria Nélson Rodrigues. E quem não se lembra daquela imagem do capitão da seleção, Tiago Silva, com os olhos cheios de lágrimas enquanto aguardava o momento de entrar em campo na estreia do Brasil na Copa? Ninguém precisa nem falar do chororô na hora do hino.
Dizer que o brasileiro chora porque é "emotivo" é pouco. Deve haver outras razões - mais profundas.
Uma coisa é certa: a irresistível vocação brasileira para o chororô não é um defeito do caráter nacional. Pelo contrário! As lágrimas - como estas, derramadas quando os nervos ficam "à flor da pele", numa disputa esportiva que mobiliza todo o planeta - podem ser belos sinais de devoção, entrega, envolvimento. Por que não? É melhor cultuar estes sinais de arrebatamento do que tentar copiar a "frieza" maquinal de outros povos.
Tanto chororô pode ter razões históricas: quem sabe, não é uma herança lusitana?
Uma vez, numa entrevista com o grande historiador Evaldo Cabral de Melo, ele chamou a atenção para um detalhe interessante: disse que quem quiser conhecer um pouco do caráter brasileiro deve observar com atenção os portões de embarque e desembarque dos nossos aeroportos.
Lá, as manifestações derramadas de afeto, as efusões, as lágrimas, os abraços, os beijos, o chororô – tudo funcionará como um retrato fiel do que o historiador, em tom crítico, chama de “pieguice luso-brasileira”.
Um pequeno trecho da entrevista:
Quais são os sintomas dessa pieguice luso-brasileira?
Evaldo Cabral de Mello – “Vou citar apenas dois exemplos – que me parecem engraçados. Primeiro : a quantidade de pessoas que, no Brasil, se deslocam aos aeroportos para levar parentes e amigos. Se você pensar bem, cada pessoa que pega um avião no Brasil é levada por outras cinco ao aeroporto…Ou vão cinco receber cada pessoa que chega. Em relação a Portugal, me lembro do caso que me contou o pintor Cícero Dias. Morador em Lisboa durante a Segunda Guerra Mundial, ele se divertia muito ao ver os barcos que faziam a ligação entre o Terreiro do Paço e Cacílias. É como a barca Rio-Niterói. A distância é até menor que do que a do Rio a Niterói. Cícero ficava sentado, às gargalhadas, vendo o número de pessoas que, aos prantos, se despediam de parentes que iam atravessar o rio…”.
( Aliás: o que é que os documentaristas estão esperando ? Por que não apontam suas câmeras durante doze horas seguidas para os portões de embarque e desembarque de algum aeroporto movimentado ? Ao término da gravação, terão em mãos, com certeza, material suficiente para compor um retrato fiel do temperamento brasileiro ).
Os portões de embarque e desembarque dos aeroportos não seriam os únicos territórios a serem pesquisados: nossos estádios não ficam atrás!
O choro dos jogadores brasileiros nos momentos mais improváveis
nesta Copa de 2014 certamente serviria como belo material de estudo para algum aventureiro que queira produzir uma Teoria Geral do Chororô Brasileiro.
Os estrangeiros, com uma ou outra exceção, se surpreendem com tanta lágrima.
Ainda bem.

Posted by geneton at junho 28, 2014 01:16 PM
   
   
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