maio 29, 2004

MOURA CAVALCANTI

O PRESIDENTE DELIRA NO PALÁCIO : QUER ANEXAR A GUIANA FRANCESA AO BRASIL !


A crise institucional aberta pela renuncia do presidente Janio Quadros terminou frustrando um plano que,se executado,ganharia,com certeza,um lugar de destaque numa antologia mundial dos desvarios politicos : o presidente queria anexar a Guiana Francesa ao territorio brasileiro,numa operacao militar de surpresa - uma investida no estilo da frustrada anexacao das Ilhas Malvinas pela Argentina,em 1982. A invasao das Malvinas deflagrou uma guerra entre Inglaterra e Argentina. Qual teria sido a reacao internacional a uma aventura expansionista brasileira na Guiana Francesa ? Janio Quadros chegou a convocar,para uma audiencia secreta em Brasilia,o governador do Amapa’,Moura Cavalcanti,um politico que,anos depois,durante os governos militares,ocuparia o Ministerio da Agricultura do general Garrastazu Medici e o governo de Pernambuco,por eleicao indireta.Moura Cavalcanti estava disposto a cumprir a surpreendente determinacao do presidente : afinal,tinha sido nomeado para o cargo de governador do Amapa’ pelo proprio Janio Quadros.Ordens sao ordens.Alem de dar a ordem a Moura Cavalcanti,o presidente passou,diante do governador,um radio para um comandante militar,com a orientacao textual :
-Estudar a possibilidade de anexar ao Brasil a Guiana Francesa - se possivel,pacificamente.

‘’Eu me recordo dos termos com exatidao ‘’- diz Moura Cavalcanti.Nesta entrevista,Moura Cavalcanti,ja’ abalado por uma doenca renal que o materia meses depois no Recife,descreve,com detalhes,a cena surrealista que presenciou,como testemunha e personagem,em Brasilia,num dia de 1961.

GMN - Que ordens o senhor recebeu do presidente Janio Quadros,em Brasilia,em relacao ‘a Guiana Francesa ?
Cavalcanti : ‘’Quando o presidente Janio Quadros analisou o processo de venda de manganes para os paises estrangeiros,me deu a seguinte ordem : ‘’Defenda os interesses nacionais acima de qualquer outra coisa.A proposito : eu acho que chegou a hora de resolver defnitivamente isso.Por que nao anexarmos a Guiana Francesa ao territorio brasileiro ?’’.

GMN - Que reacao o senhor teve ao receber esta ordem ?
Cavalcanti : ‘’Uma reacao violenta.Primeiro,o seguinte : nao tinha estrutura para agir um conquistador.Nao tinha sonhado em conquistar terras,nas minhas andancas por Macaparana(N: terra natal do ex-governador,em Pernambuco).Quando muito,tinha pensado em aumentar o meu engenho...Andei de um lado para o outro;fiquei confuso,evidentemente.E Janio Quadros me disse : ‘’Sente aqui !’’. Eu me sentei junto ao telex.E ele passou um telex a um militar que,me parece,era o chefe do Estado Maior das Forcas Armadas’’.
GMN - Que comentario Janio Quadros fez sobre o plano ?
Cavalcanti : ‘’Janio Quadros me disse : ‘’Um pais que dominar do Prata ao Caribe falara’ para o mundo !’’.O presidente olhou o pequeno papel que tinha nas mais,com a ordem.Olhou o mapa do Brasil,imenso,na parede.Balancou lentamente a cabeca,antes de dizer que um pais que fosse do Prata ao Caribe seria respeitado e dominaria o mundo’’.
GMN - Por que e’ que esta ideia do presidente nao se realizou ?
Cavalcanti : ‘’Porque Janio Quadros renunciou algumas dias depois.A conversa com Janio ocorreu em agosto de 1961 - ‘as vesperas da renuncia’’.
GMN - Como e’ que seria feita,na pratica,esta anexacao ?
Cavalcanti : ‘’A anexacao da Guiana Francesa comecaria com uma visita de Janio Quadros a’ Amazonia.Uma esquadra chegaria ao cais do porto,no Amapa’’’.
GMN - A principal motivo da anexacao seria economica ?
Cavalcanti : ‘’O presidente queria evitar a saida de minerios do territorio brasileiro.A saida de minerios era uma coisa incrivel.Uma parte saia atraves da Guiana;outra atraves do nosso porto’’.
GMN - Que outra orientacao ele deu ?
Cavalcanti : ‘’Janio falou muito sobre o disciplinamento do transito dos minerios’’.
GMN - O senhor estava disposto a cumprir a ordem do presidente ?
Cavalcanti : ‘’Eu estava disposto a cumprir o que ele desejava’’.
GMN - O projeto,entao,so nao se realizou por causa da renuncia ?
Cavalcanti : ‘’A minha parte eu cumpriria ! (silencio).Em um mes,eu criei uma Policia Militar’’.
GMN - Como seria feita a anexacao ? Atraves da abertura de uma picada na selva ?
Cavalcanti : ‘’Cabia a mim a abertura da picada,ate’ Oiapoque.(N:onde havia uma base militar brasileira e uma base militar francesa).Vi a queda das castanheiras.Quando recebi a orientacao do presidente,fui para a fronteira.Consegui,com uma base americana que ficava localizada no Caribe,um helicoptero. Eu me lembro que um assessor me dizia : ‘’Se esse helicoptero cai na floresta amazonica,vai dar manchete ! Helicoptero cai e morre governador e secretario !’’.
GMN - Quando o presidente Janio Quadros falou sobre a anexacao da Guiana,so estavam no gabinete o senhor e ele ?
Cavalcanti : ‘’So estavamos eu e ele.O presidente.Antes,ele nao me disse que eu nao levasse ninguem nem me pediu para que eu nao falasse.Disse,apenas,que o assunto seria secreto’’.
GMN - Que outras pessoas souberam desta conversa,na epoca ?
Cavalcanti : ‘’Cordeiro de Farias ( n: marechal) soube;Golbery do Couto e Silva soube,Jose’ Aparecido de Oliveira,tenho a impressao,soube’’.
GMN - O ministro das relacoes exteriores,Afonso Arinos,estava presente ?
Cavalcanti : ‘’A este encontro meu com o presidente,ele nao estava presente.Mas,como ele dizia que os ministros eram ministros de verdade,Afonso Arinos deve ter sabido’’.
GMN - Como e’ que o senhor avalia este episodio hoje ? Que importancia este plano teria para a historia do pais ?
Cavalcanti : ‘’Hoje,nos estamos diferentes’’.
GMN - Mas,na epoca,a anexacao poderia ter acontecido ?
Cavalcanti : ‘’Poderia ! Poderia ter acontecido.E seria aceito pela Franca.A base francesa tinha um coronel que vivia bebado.Era um batalhao de elite - que foi para dentro da selva.A gente via que eles tinham desejo que aquilo acontecesse. A anexacao seria uma operacao militar.Uma estacao de rastreamento seria criada’’.
GMN - Depois que recebeu a noticia da renuncia do presidente,o senhor se sentiu aliviado diante da perspectiva da invasao da Guiana ?
Cavalcanti : ‘’Tive um sentimento de perda.
Eu pensava que o caminho era aquele.Pode ser orgulho meu’’.

Posted by geneton at maio 29, 2004 01:25 PM
   
   
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