outubro 05, 2006

O LUGAR EM QUE A HISTÓRIA FICA AO ALCANCE DA MÃO. É SÓ TECLAR

1. Um gesto absolutamente banal pode mudar o curso da História? Pode. Tenho a tentação de pensar que pode, ao ver um vídeo no Museu da Televisão e do Rádio, em Nova York: uma aeromoça diz que,no dia dez de setembro de 2001, estranhou a atitude de um suposto passageiro que, perto do balcão da companhia, fazia anotações enquanto observava a movimentação no aeroporto. "Se ele entrasse no avião, eu teria avisado ao comandante", diz. Mas o autor das anotações não embarcou ali. Desapareceu na multidão. Iria viver o último dia de anonimato.


Um dia depois, ele comandaria o grupo de sequestradores que cometeu o maior atentado da História. Quando viu as fotos dos sequestradores na TV, a aeromoça tomou um susto: o homem que ela vira no aeroporto era Mohammed Atta. E se ela tivesse levado adiante suas suspeitas? E se tivesse pedido a alguém que abordasse o observador? O que teria acontecido? Aos que acham que especulações assim não exercícios perfeitamente inúteis: a chamada "História Virtual", feita a partir de hipóteses, mobiliza exércitos de fãs. Um professor da Universidade de Oxford, Niall Ferguson, o historiador mais popular da Grã-Bretanha, fez um livro sobre o assunto. Imaginou o que teria acontecido se os fatos históricos tivessem tomado outros rumos. Diversão garantida. A realidade paralela pode ser tão fascinante quanto o que realmente acontece.

O Museu da Televisão e do Rádio pode ser uma decepção para quem espera encontrar, ali, vitrines multicoloridas ou máquinas maravilhosas. Tudo o que há são banalíssimos aparelhos de TV, devidamente conectados a fones de ouvido. O fascinante é o acervo: o forasteiro escolhe um assunto, digita o código do programa que quer ver, equipa-se com um fone de ouvido e começa a viajar diante dos monitores.

Ao lado, alguém ri alto com as tiradas do Agente 86, seriado que povoou as tardes de minha infância.

Minha porção catastrófica se manifesta. Por pura curiosidade, vejo o vídeo-tape do assassinato do senador Robert Kennedy, atingido em junho de 1968 pelas balas de um imigrante jordaniano no momento em que caminhava entre correligionários eufóricos, num hotel em Los Angeles. Tinha feito, minutos antes, um discurso de agradecimento pela vitória que acabara de conquistar na briga para ser indicado candidato do Partido Democrata à Presidência dos Estados Unidos. Sirhan Bishara Sirhan deu um tiro à queima-roupa na cabeça do senador. Kennedy provavelmente seria eleito presidente. A câmera começa a gravar segundos depois dos disparos. Pandemônio. Tumulto. O som mais impressionante é o grito de uma mulher. Horror puro. De quem terá sido?

Forasteiros que trocam o prazer de caminhar pelas ruas de Nova York pela aventura de explorar o
paraíso das imagens do Museu da Televisão e do Rádio não terão motivo para arrependimento.

Dou stop no depoimento da aeromoça, guardado para sempre nas prateleiras do Museu. Interrompo a exibição da cobertura do atentado ao senador que ia ser presidente.

As portas do Museu vão fechar já, já. Fim de expediente. Volto ao ano de 2006. Mas é bom saber que existe um lugar em que a visão da História fica ao alcance da mão. É só teclar um número. A tela cinza do monitor se ilumina daquela cor azulada. Vozes soterradas nos calendários ressurgem nos fones de ouvido.

Próxima catástrofe, por favor.




Posted by geneton at outubro 5, 2006 07:36 PM
   
   
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