junho 28, 2011

EVANDRO CARLOS DE ANDRADE 5

ENTREVISTA COM EVANDRO CARLOS DE ANDRADE -5 / CENAS DOS BASTIDORES DE UMA CAMPANHA PRESIDENCIAL : JORNALISTAS RECEBEM REVÓLVERES PARA ACOMPANHAR O COMÍCIO DE JK NO SERTÃO DE PERNAMBUCO

O Diário Carioca daria a um Evandro ainda verde na profissão a primeira grande chance de participar intensamente de uma cobertura importante. Quatro candidatos disputavam a Presidência da República : Juscelino Kubitschek (PSD/PTB); Juarez Távora (UDN/PDC); Ademar de Barros (PSP) e Plínio Salgado (PRP). Coube a Evandro a tarefa de acompanhar, para o Diário Carioca, a campanha de um candidato sorridente que, depois de ganhar no voto o governo de Minas Gerais, agora sonhava com a Presidência da República : Juscelino Kubitschek de Oliveira.

O relato de Evandro:

“Durante a campanha, enfrentamos situações de perigo a bordo do avião que servia a Juscelino. Mas, diante de situações como, por exemplo, o incômodo do calor e da poeira no Nordeste, eu preferia estar voando a estar em terra. Parecia mais confortável. Mas devo dizer que o avião que Juscelino usou durante toda a campanha não podia ser mais desconfortável : o DC-3 não tinha pressurização, não tinha nada - uma coisa horrível. Guardei o prefixo : era um avião da Nacional Transportes Aéreos, PP-ANY. Houve cenas assim : Juscelino recebeu um aviso de que não deveria seguir de Manaus para Santarém, porque o tempo estava horroroso. Mas o avião tentou pousar, debaixo de tempestade. Além da chuva tremenda, o capim cobria a pista. Resultado : o avião arremeteu três vezes. Quando o piloto tentava pousar, tinha de desistir da manobra, porque o capim e a tempestade atrapalhavam a visão do traçado da pista de pouso. Só conseguiu depois da terceira tentativa”.

“Depois, ao decolar, no interior do Rio Grande do Sul, o avião levantou um pouco , teve uma pane e caiu num banhado logo em seguida. Os pilotos Prates e Torres – que tinham sido da FAB – faziam coisas incríveis durante essa maratona da campanha. Viajamos de Salvador a Recife a quinze metros de altura – um vôo rasante pelo litoral. Os pescadores se abaixavam quando viam aquele bichão dando rasante. Era o avião de Juscelino. José Moraes, secretário de imprensa de Juscelino, se indispôs uma vez com um dos pilotos, em Santa Catarina. Como vingança, o piloto resolveu brincar com o avião. Fazia manobras quase na vertical. Quando pousamos, havia gente machucada a bordo. Juscelino não estava no avião, porque tinha embarcado num teco-teco para percorrer pequenas cidades do Estado. Eu escapei do susto porque, como cupincha dos pilotos, fui para a cabine. O engraçado é que, quando a gente passou por José Moraes – a quem os pilotos quiseram assustar com a manobra – ele estava lendo um livro de bolso. Sempre andava com um pocket book de ficção, em inglês. Lívido, sério, ele fazia de conta que estava absorvido pela leitura – mas o livro estava de cabeça para baixo. Fez de tudo para não passar recibo do susto. José Moraes era um bom sujeito. Bebia cachaça mas nunca tinha ressaca. Não ficava bêbado. Lá pelo segundo ano de governo, sentiu-se ligeiramente mal. Quando os médicos abriram, viram que ele estava todo corroído.Logo depois, ele morreu”.

“Quando íamos descer em Petrolina, no sertão de Pernambuco, para um comício, o operador recebeu um recado : “Não venham, porque vocês vão ser recebidos a tiros !” . O aviso nos foi transmitido por rádio. A bordo, havia uma mala de couro, cheia de munição. Cada um de nós recebeu uma arma. Desembarcamos em Petrolina armados com revólveres, para o comício que Juscelino ia fazer. As armas nos foram entregues ainda dentro do avião. Um major deve ter distribuído as armas. Nosso grupo devia ter uns dez pessoas. ”Vamos em frente”. Juscelino não era nada truculento. Mas o grupo estava pronto para o que desse e viesse. Para dizer a verdade, eu estava com um medo desgraçado, porque nunca tinha dado um tiro na vida. Mas estava pronto para o pau- uma maluquice completa. A arma pesava. Tinha munição de verdade. Era para morrer heroicamente em Petrolina…. Não era possível saber o que nos esperava, ali, no alto sertão. Mas – felizmente - nada de anormal aconteceu. Juscelino fez um comício ótimo, numa praça linda . Quem organizava bem essas manifestações, com faixas para todo lado, era o Partido Comunista. Juscelino era um sucesso. As multidões iam vê-lo, empolgadas, porque ele transmitia simpatia. De qualquer maneira, a ameaça que tinha sido transmitida à comitiva ainda no avião, antes do comício de Petrolina, nos assustou”.

Posted by geneton at junho 28, 2011 03:29 AM
   
   
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